quinta-feira, 3 de julho de 2008

Créditos de emergência pagam casa

Os portugueses estão a recorrer cada vez mais ao crédito de emergência, como o crédito ao consumo e o cartão de crédito, para pagar as prestações da casa e do automóvel. Com as dificuldades financeiras a aumentarem por causa da subida do preço dos alimentos, dos combustíveis e das taxas de juro, o número de famílias com mais de três créditos já representa 66% do total de agregados sobreendividados. E se o Banco Central Europeu (BCE), liderado por Jean-Claude Trichet, subir hoje a taxa directora para 4,25%, "esta situação agrava-se ainda mais", antevê Natália Nunes, da DECO.
Os dados da DECO são elucidativos sobre a tendência imparável do endividamento excessivo em Portugal: no primeiro semestre deste ano o número de famílias sobreendividadas atingiu 777 casos, um aumento de 22 por cento face aos 636 casos verificados em igual período do ano passado. O pior é que a solução para resolver estas situações não é a mais adequada: 'Quando começam com dificuldades, aquilo que as famílias fazem é contratar crédito ao consumo e usar o cartão de crédito para pagar créditos anteriores', diz Natália Nunes.
Daí que daqueles 777 casos de sobreendividamento, 474 tinham entre três e dez créditos, 38 dispunham de mais de dez créditos e 275 governam-se com um ou dois créditos. Também por essa razão, 'infelizmente há cada vez mais situações de insolvência', diz a responsável da DECO. A subida dos juros vai agravar ainda mais as finanças das famílias portuguesas. Em 2007 houve 1796 casos de sobreendividamento.
'SUBIDA AUMENTA SACRIFÍCIO DAS FAMÍLIAS' (Catarina Frade, Observatório do Endividamento)
Correio da Manhã – 0 que significa este aumento para as famílias já em dificuldades?
Catarina Frade – Vai aumentar o sacrifício das famílias. Quando as pessoas se endividaram, a taxa de esforço era menor mas estes aumentos vão agravando a situação.
– O que podem fazer para se defender de mais este agravamento dos juros?
– Se ainda não o fizeram, devem renegociar os spreads contratualizados. Devem pois dirigir-se ao banco e pedir a renegociação da taxa aplicada àquele empréstimo. Também podem tentar transferir o crédito para outra instituição bancária. Sempre que possível deverão criar almofadas [poupanças] de forma a fazer amortizações. Mesmo que sejam pequenas, já que por vezes compensa a subida de juros.
– Também tem a percepção de que muitas famílias estão a tentar pagar prestações de empréstimos em falta pedindo mais créditos?
– Sim e esse é o grande perigo: o aumento do multiendividamento. As pessoas recorrem muitas vezes ao crédito pessoal ou o crédito rápido para pagar algumas prestações em atraso. O que acontece frequentemente é que, devido à grande pressão, o dinheiro acaba por ser desviado para outras despesas e os créditos transformam-se numa bola de neve.
DINHEIRO VAI FICAR MAIS CARO
A subida da taxa de juro directora, que deverá ser decretada hoje pelo Banco Central Europeu (BCE), tem implicações directas nas prestações dos créditos das famílias, já penalizadas pelos aumentos na taxa Euribor (que serve de referência nos empréstimos à habitação).
A taxa do BCE encontra-se nos quatro por cento desde Junho de 2007 mas as praticadas pelos bancos entre si (Euribor) encontram-se próximas dos cinco por cento (a três e seis meses) e nos 5,3 por cento, no prazo de um ano.
Esses diferenciais são pouco comuns na história do BCE, segundo alguns analistas, tendo só acontecido em meados de 2000, mas em circunstâncias muito distintas.
Os portugueses, tal como os restantes europeus, têm vindo a pagar os empréstimos cada vez mais caros, com a subida das taxas de juro de mercado e com um prémio de risco que só no final de 2009 deve corrigir em baixa, segundo analistas ouvidos pela Lusa.
A falta de confiança entre bancos e a existência de produtos de difícil avaliação estão a impor um funcionamento anormal no mercado interbancário, com as instituições financeiras a cobrarem mais caro pelo dinheiro que emprestam, a retirarem liquidez por não saberem se no dia seguinte vão precisar de mais dinheiro ou de provisionar mais por causa do malparado, numa altura em que a economia está a desacelerar.
EVITAR A SUBIDA
Para negociar com os bancos formas de evitar a subida da prestação no crédito hipotecário é fundamental que não haja falhas nos pagamentos das prestações.
FILHOS ASSUMEM DÍVIDA
Bancos prolongam os empréstimos tendo por base não a idade do mutuário mas do fiador. Filhos assumem o pagamento do empréstimo dos pais.
DIFERIR CAPITAL
Os devedores deixam de pagar o capital durante um ano e só pagam os juros. A prestação é mais baixa. Ao fim de um ano, esta opção pode ser renovada.
TAXA FIXA
Negociar o empréstimo com taxa fixa a três ou cinco anos, garantido o mesmo valor da prestação.
NOTAS
MEDITERRÂNEO: AVISOS AO BCE
Nas últimas semanas, os países da Europa do Sul alertaram várias vezes o BCE para os riscos que uma subida da taxa Euribor terá na situação financeira das famílias e empresas europeias.
SARKOZY: AJUDAR A EUROPA
O presidente Nicolas Sarkozy defendeu que o BCE 'deveria questionar-se também sobre o crescimento económico na Europa e não apenas sobre a inflação'.
RISCO: DESCIDA SÓ EM 2009
De acordo com os analistas, o prémio de risco das taxas de juro só no final de 2009 deve baixar. Até lá, os europeus continuam a pagar os empréstimos cada vez mais caros.
Fonte: Correio da Manhã

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